Câmara de São Paulo Aprova Projeto que Proíbe Linguagem Neutra na Administração Pública
Proposta avança na CCJ e reacende debate sobre inclusão e normas linguísticas
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São Paulo, 15 de maio de 2025 — A Câmara Municipal de São Paulo deu um passo decisivo nesta semana ao aprovar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o projeto de lei que visa proibir a utilização da linguagem neutra em documentos oficiais e materiais de órgãos públicos da capital. O texto, apresentado pelo vereador Rubinho Nunes (União Brasil), agora segue para o plenário da Casa.
O PL determina que documentos, comunicados, editais e qualquer forma de comunicação institucional utilizem exclusivamente a norma-padrão da língua portuguesa, vetando o uso de pronomes e flexões que tentem neutralizar gênero, como “todes”, “amigxs” ou “elu/delu”.
Para Nunes, o uso da linguagem neutra é uma tentativa de “imposição ideológica” por parte de setores militantes. Segundo ele, o foco do serviço público deve estar na clareza e acessibilidade da linguagem, e não na adaptação a "modismos linguísticos que confundem mais do que comunicam".
“A linguagem neutra não representa inclusão, mas sim uma agenda ideológica que quer forçar mudanças artificiais no idioma. Nossa proposta garante que o Estado fale a língua da população, com clareza e responsabilidade”, declarou o vereador durante a sessão da comissão.
Conflito ideológico e reações diversas
A tramitação do projeto gerou intenso debate entre os parlamentares. A vereadora Silvia Ferraro (PSOL), por exemplo, criticou duramente a proposta. Ela argumenta que a linguagem neutra é um reflexo da diversidade social e uma ferramenta para garantir que pessoas não-binárias e trans sejam incluídas nas comunicações oficiais.O projeto, no entanto, vem ganhando força entre parlamentares conservadores, que enxergam na proposta uma defesa da "coerência linguística" e da "neutralidade política do Estado".
Precedentes e possíveis impasses legais
Essa não é a primeira tentativa de barrar o uso da linguagem neutra em órgãos públicos no Brasil. Propostas semelhantes já foram sancionadas em cidades como Porto Alegre, mas enfrentam resistência jurídica.O Supremo Tribunal Federal (STF) já declarou inconstitucionais leis estaduais e municipais com conteúdo similar. Um dos principais argumentos é que somente a União pode legislar sobre diretrizes educacionais e que a liberdade de expressão deve ser respeitada, inclusive na linguagem.
A ministra Cármen Lúcia, em decisão de 2024, afirmou que proibir o uso da linguagem neutra em escolas é um retrocesso e fere princípios constitucionais de igualdade e dignidade.
Impacto social e educacional
Especialistas em linguística e direitos humanos têm acompanhado a movimentação da Câmara de São Paulo com preocupação. Para o professor Luiz Amaral, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a proibição pode ter efeito simbólico negativo para jovens e estudantes que buscam se ver representados na linguagem cotidiana.“A linguagem neutra não é apenas um modismo; ela é fruto de um movimento legítimo de inclusão. Quando o poder público a proíbe, ele envia uma mensagem de exclusão para pessoas que já enfrentam marginalização”, pontua o especialista.
Além disso, educadores alertam para a confusão que medidas desse tipo podem causar nas escolas, especialmente diante da ausência de uma regulamentação nacional clara sobre o uso ou não da linguagem neutra no ambiente educacional.
Próximos passos
Com a aprovação na CCJ, o projeto será analisado em plenário. Caso aprovado pela maioria dos vereadores, seguirá para sanção ou veto do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que ainda não se posicionou publicamente sobre o tema.Se a lei for promulgada, há a expectativa de que ela seja judicializada, assim como aconteceu em outras capitais. O tema deve voltar ao Supremo Tribunal Federal, que já firmou entendimento em favor da liberdade linguística em contextos educacionais e institucionais.
A proposta de banir a linguagem neutra em São Paulo coloca a cidade no centro de um debate que vai além da gramática. A discussão toca em questões profundas sobre identidade, representatividade e os limites da intervenção do Estado sobre a linguagem. Resta saber como a sociedade, a Justiça e o poder público irão conciliar tradição linguística e evolução social em uma das maiores metrópoles do hemisfério sul.
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